Dia 54
Fevereiro 23, 2021
O candeeiro na cabeceira era mera luz de presença, não permitia a leitura. Iluminava de mansinho a chávena de cerâmica pintada, os dois livros - àquela distância era impossível ler os títulos, mas o de cima era pesado e de capa amarela e o de baixo branco e estreito, quase sem lombada - e a caneta pousada na mesinha, bem como a almofada encostada à parede. A fronha era bege e com flores a pontuar a monotonia. A mesinha tinha de um lado a cama e do outro uma cadeira antiga, onde ele largara a roupa do dia sem critério. Uma manga de camisa roçava o chão de madeira com desespero. O quarto era monástico e obscuro, mesmo com o estore mal fechado. Estava vazio, mas cheirava a pessoas, como se alguém o tivesse abandonado em fuga pela janela sem cortinados. Fechei a porta sem ter chegado a ultrapassá-la, não me aventurei a apagar a luz.